sábado, 1 de agosto de 2009

A Feitiçaria: entre o Discurso e a Realidade

Feiticaria O infortúnio não ocorre por acaso - isto parece ser crença dalgumas pessoas que habitam a Manga, um dos bairros dos arredores da cidade da Beira. É só por cautela que me abstenho de dizer que se trata duma crença generalizada. Por outro lado, assumindo que existe uma proporcionalidade inversa entre a crença na feitiçaria e a crença no acaso, seria importante investigar-se a existência ou não, nesses habitantes, da crença no acaso. As línguas faladas localmente seriam o nível básico dessa investigação, cujo objectivo seria procurar palavras que correspondam a acaso.

Manga é o bairro onde nasci e vivi até aos meus 20 anos. Depois de ter vivido fora por 10 anos, encontro-me de volta à Manga há já 1 mês. Esse tempo de ausência, apesar das minhas visitas regulares, foi suficiente para eu não reconhecer os meus conterrâneos, pelo menos, num aspecto. Quando eles falam de infortúnios, fazem existir os seus causadores, os feiticeiros, através das suas palavras e das suas mentes.

Feiticeiros, identificados ou não e, quiçá, existindo independentemente das palavras e das crenças ou não, são pessoas que, por meios extraordinários, causam insucessos, doenças e/ou mortes nas suas vítimas. Contudo, não são quaisquer insucessos, doenças ou mortes que são atribuíveis aos feiticeiros. Os infortúnios causados por eles têm uma marca característica - a anormalidade. Tenho a impressão de que os velhos, os pobres, nalguns casos, podem morrer; uma doença efémera pode afectar alguém. Com pessoas e coisas dessas classes, os feiticeiros não se interessam! Pelo contrário, quando se trata duma morte precoce, da morte duma pessoa abastada, da morte duma pessoa que não adoecera (aos olhos dos habitantes locais), então deseja-se que o/a feiticeiro/a seja oficialmente identificado/a, visto que ele/a já foi entrevisto/a. A identificação precisa e oficial do/a feiticeiro/a é feita por especialistas... Sendo os feiticeiros reais ou não, uma realidade, entretanto, é que as pessoas tidas como tais, em casos extremos, são punidas até a morte... Por outro lado, algumas pessoas, a priori, protegem-se de possíveis ataques de feiticeiros...

Vejo-me confrontado com o acto habilidoso de construção de seres com poderes extraordinários através da mente e de palavras; vejo-me num campo bem atraente para pesquisa, mas tenho que ver como começar...